sábado, 21 de agosto de 2021

 


AULA DE SÁBADO

 

Era um sábado à tarde e tínhamos aula. Embora estivéssemos receosos, ainda em plena pandemia do Covid-19, o retorno à escola nos faziam bem. Quem é do chão da escola, sente falta deste convívio. Pouco a pouco, a rotina era retomada, as lembranças iam surgindo, de tantas realizações e experiências ali vividas.

O dia a dia de uma escola é um mundo, que apesar de estar à parte, está perfeitamente integrado à sociedade, e com ela, dialogando constantemente.

Entrei na sala, cumprimentei a turma e iniciei o assunto, que versava sobre “As várias áreas de estudo da filosofia”. Subitamente, observei que uma aluna estava totalmente alheia a tudo ao seu redor, totalmente concentrada em desenhar. Havia vários desenhos na folha do seu caderno, e ela agora colocou a mão na face, naquela posição clássica de “pensadora”, o que aliás, combinava bem com a aula de filosofia.

Resolvi não lhe chamar a atenção para a atividade que acabara de passar para a turma. Lá pelas tantas, ela finalmente olhou para mim e para o quadro. Fez a atividade proposta e retornou para o seu desenho.

Eu apenas observava, e fiquei pensando, o que a levava àquele ímpeto de desenhar. Certamente, as pessoas já nascem com certos dons e talentos, que precisam serem apenas desenvolvidos e aprimorados.

É uma pena que a escola, muitas vezes preocupada em cumprir o currículo, não oportunize aos alunos a possibilidade do desenvolvimento de seus muitos dons e talentos.

Agora mesmo, com as olimpíadas, ficou claro a falta de apoio dos nossos governantes aos atletas brasileiros. A maioria deles, como Rebeca Andrade ou Ítalo Ferreira, venceram e conquistaram medalhas, graças a seus esforços, talentos e iniciativas individuais. Em países desenvolvidos, o esporte, à iniciação às artes e à literatura são políticas públicas de Estado, integradas ao currículo.

O filme “Encontrando Forrester”, um triunfo na carreira cinematográfica de Sean Connery, ilustra bem este contexto. Nele, um jovem talentoso, vindo da periferia do Bronx, precisava ter bom comportamento e boas notas, para ter acesso aos torneios de basquete, que tudo somado, poderiam lhe abrir as portas a uma boa e conceituada universidade.

O sinal tocou para o segundo horário, eu precisei mudar de sala. Hoje, eu me lembrei que o professor é aquele que ensina, mas que também aprende. A nossa escola pública está cheia de talentos, que possam ver aqueles que tenham a sensibilidade e o interesse para ver.

Erivan Santana, 21VIII2021

 


 


quinta-feira, 5 de agosto de 2021

 



NO BANCO, EM TEXAS

 

Ultimamente, tenho evitado ir ao banco, sobretudo para atendimento presencial, mas um dia desses, precisei ir. Depois de um bom tempo numa fila externa, sou conduzido ao interior do banco, e me sento em uma poltrona, imediatamente passo a observar as demarcações tão comuns, nesse tempo de Pandemia do Covid-19.

Ao lado, havia um senhor, já de idade, acompanhado do seu jovem filho. Eles começam a conversar, e eu deliberadamente, observo, atentamente.

- Pai, o senhor deveria acionar o atendimento digital do banco

- Para quê, filho, gosto do atendimento presencial, de conversar com os muitos amigos que sempre aqui encontro, e os funcionários sempre me atendem bem, e conversam comigo.

Do lado de fora, as pessoas começam a se impacientar; devido ao contexto atual, o atendimento bancário ficou muito deficiente, há um ar de medo, preocupação e ansiedade em todos, ali. Com a demora no atendimento, o filho retoma a conversa.

- Está vendo pai, como o atendimento está demorando? Poderíamos fazer tudo isso pelo digital e não haveria necessidade de virmos até aqui.

- Filho, eu venho aqui mais pela conversa e atenção dos funcionários para comigo. Eles perguntam pela minha saúde, pela família, me oferecem um café, conversamos sobre vários assuntos, política, causos e lembranças...

Diante do diálogo, ponho-me a refletir sobre a riqueza de reflexões e complexidades envolvidos nessa típica cena do cotidiano.

Ela revela a falta de afeto, de diálogo no âmbito da família, mas também em vários contextos, como ambientes de trabalho, relações pessoais, etc.

O atendimento comercial, salvo várias exceções, além de precário, é desumanizado, mal atende às necessidades do cliente.

A visão de mundo daquele senhor, em conversa com seu filho, despertou em mim  diversas reflexões e sentimentos, sobre como estamos acostumados à banalização da vida, das pessoas e das relações.

Observei os seus cabelos brancos, e me lembrei da poeta Cora Coralina: “O conhecimento, nós adquirimos com os livros e a escola; o saber, aprendemos com a vida e as pessoas mais simples e humildes”.

Finalmente, sou atendido e deixo o banco, fazia muito frio e chovia em Texas, o dia estava convidativo para ler um livro, interpretar as sutilezas da vida e do mundo.

Erivan Santana: Texas, VIII, 2021




 

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