Carta a Aurélio Buarque
de Holanda
Teixeira de Freitas –
BA, primavera de 2020
Caro Aurélio,
Venho lhe pedir minhas sinceras desculpas, criador e criatura, ao esquecimento a que tens sido relegado, e isto tudo, depois da onipresença do “santo google”. São poucos os que ainda recorrem a seu imponente e competente dicionário, mas o fato é que a dúvida tirada a um simples clique, tem seduzido escritores e leitores, sobretudo, os menos exigentes.
Se bem que aquele poeta
modernista desaconselha a busca ao dicionário, principalmente de palavras muito
rebuscadas e sofisticadas, mas depois da nova reforma ortográfica da língua portuguesa,
a necessidade do dicionário se faz presente. Afinal, essa ou aquela palavra é
junto ou separado? E o acento de outras tantas, como que fica? Quem é que guarda aquele tanto de regrinhas
que os chamados doutores da língua portuguesa elaboraram, quando demarcaram o
tal acordo? Muito bem nos lembra Drummond, quando começam figuras de gramática,
regras e que tais, as coisas só se complicam, que venha o lirismo livre dos
clowns de Shakespeare, dos loucos e bêbados, como bem disse Bandeira, e viva a
poética!
Entretanto, essa
submissão ao google preocupa. A dominação ideológica a partir do desenvolvimento
da tecnologia, já era prevista pelos filósofos da Escola de Frankfurt, entre
eles Horkheimer, Habermas e Walter Benjamin, que alertavam sobre este risco. Se
observarmos bem, a internet hoje é dominada por verdadeiros impérios, como o
próprio google, o facebook (que administra também o whatsapp e o instagram), o
twitter e o you tube, ou seja, é muito predomínio.
Voltando ao assunto,
meu caro filólogo, prometo retirá-lo do fundo da biblioteca e colocá-lo-ei mais
próximo, de maneira que a saudade de folhear estas páginas imortais seja sempre
despertada.
Saudações literárias
das terras baianeiras, tão bem contempladas no seu vernáculo, para o bem geral
da nação!
Erivan Santana