MEMÓRIAS DE UM CERTO ESCRITOR
Era fim de tarde na cidade do Rio de Janeiro. Um senhor elegante e com passos decididos, caminha no Largo da Carioca. O acendedor de lampiões passa por ele, pronto para iniciar o seu trabalho, o bondinho de Santa Tereza cruza a estação, carregado de operários, feirantes, gente do povo, retornando para as suas casas.
O notável escritor foi
até à Tabacaria Portuguesa, procurar a última edição da Revista Brasileira,
onde tinha acabado de ser publicado o último capítulo de “Memórias Póstumas de
Brás Cubas”, livro que norteia e inaugura a fase consagrada do autor, e marca o
início do que há de melhor em nossa literatura, o que efetivamente se consolida
em seguida, com “Dom Casmurro”.
Na verdade, os livros
em questão foram pouco compreendidos à época, caracterizados pela fina ironia,
os duplos sentidos, a metalinguagem, o enredo escrito de modo não linear, a
inovadora originalidade.
A esta altura,
conhecido e admirado pela alta sociedade carioca, Machado de Assis conhecia e acompanhava
a literatura europeia, e apesar das suas recentes propostas, como o determinismo
social, a descrição minuciosa dos personagens e ambientes, o engajamento
político, o eminente escritor brasileiro interessava-se pela crítica fina e
irônica às pessoas e à sociedade, a imersão na análise sutil da psicologia dos
personagens, sempre de forma a demonstrar, muitas vezes, a pequenez da condição
humana.
O modernismo brasileiro
muito lhe deve, já, que na verdade, foi o precursor desta definitiva literatura
que ficou para a posteridade. A leitura da sua obra é sempre um exercício de
conhecimento e novas descobertas, dado a grandeza e originalidade dos escritos
do “Bruxo do Cosme Velho”.
Machado de Assis, de
origem humilde, negro e autodidata, fundador da ABL (Academia Brasileira de
Letras), é considerado o nosso maior escritor e está ao lado dos maiores nomes
da literatura universal.