O ANO QUE NÃO
TERMINARÁ
Pensando sobre o ano de 2020, lembrei-me de dois livros que narram a história recente do nosso país, e que são bem emblemáticos, cada um à sua maneira. Refiro-me a “Feliz 1958: o ano que não devia terminar” de Joaquim Ferreira dos Santos e “1968: o ano que não terminou” de Zuenir Ventura.
O primeiro, como
o título já insinua, é uma celebração da felicidade, o Brasil acabava de ganhar
o seu primeiro título mundial de futebol, revelando um garoto de 17 anos, que
viria a ser considerado o rei do futebol, Pelé. Vivia-se a era do romantismo e
da inocência no país, com o surgimento da bossa nova, e o esplendor e beleza de
Martha Rocha, com Copacabana sendo capa de revistas e jornais, país afora. O
segundo, relata as tristes memórias e consequências do regime de exceção, que
de acordo com os historiadores, vai de 1964 a 1985.
Segundo Evanildo
Bechara, em sua “Moderna gramática portuguesa”, o futuro, como tempo verbal, se
divide em dois. O futuro do presente aponta o Norte: diz respeito ao que se
deseja realizar, construir, experimentar. O futuro do pretérito trata do não
efetivado. Este ano traz em si, estas duas características. Foi um tempo de
sonhos e projetos adiados; e também de improvisos, surpresas, e perdas inesperadas,
vidas interrompidas, existências abreviadas.
A pandemia do Covid-19
trouxe à tona realidades que estavam esquecidas ou encobertas, em todo o mundo.
Mostrou que o homem, diante do desenvolvimento científico e tecnológico a que
chegou, não tem nenhum domínio sobre a natureza. Deixou claro a falta de
sensibilidade para com o próximo, pois mesmo em países ricos, os sistemas de
saúde de amparo à população se mostraram ineficientes, dependendo de mais
atenção e investimentos. Neste particular, é louvável a existência e atuação do
SUS no Brasil, que mesmo diante da falta de verbas e melhorias na sua
infraestrutura, foi e tem sido a salvação de centenas, milhares de brasileiros.
Outras questões
também ficaram muito visíveis, como a inviabilidade do pensamento de Estado
mínimo, defendido pelo capitalismo neoliberal, simpáticos da escola de Hayek e
do Consenso de Washington. Existem áreas, como saúde, educação e segurança, em
que é necessária a presença forte e permanente do Estado, sob pena do
comprometimento da já frágil estrutura social do país.
O presente e o futuro estão sempre em construção, e certamente a história elegerá 2020 como o “ano que não terminará”.
Erivan Santana